09 maio 2012

Documento/Monumento

Depois de um longo tempo sem postagens eis que volto! =]

Acabei de ler o último capítulo do livro História e Memória do Jacques Le Goff, intitulado Documento/Monumento e reproduzo aqui um trecho sobre documento e que achei sensacional e que tem grande relação com a minha pesquisa:

"[...] A intervenção do historiador escolhe o documento, extraindo-o do conjunto dos dados do passado, preferindo-o a outros, atribuindo-lhe um valor de testemunho que, pelo menos em parte, depende da sua própria posição na sociedade da sua época e da sua organização mental, insere-se numa situação inicial que é ainda menos "neutra" do que a sua intervenção. O documento não é inócuo. É, antes de mais nada, o resultado de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade que o produziram, mas também das épocas sucessivas durantes as quais continuou a viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo silêncio. O documento é uma coisa que fica, que dura, e o testemunho, o ensinamento (para evocar a etimologia) que ele traz devem ser em primeiro lugar analisados, desmistificando-lhe o seu significado aparente. O documento é monumento. Resulta de esforços das sociedades históricas para impor ao futuro -- voluntária ou involuntariamente -- determinada imagem de si próprias. No limite, não existe um documento-verdade. Todo documento é mentira. Cabe ao historiador não fazer o papel de ingênuo. Os medievalistas, que tanto trabalharam para construir uma crítica -- sempre útil, decerto -- do falso, devem superar esta problemática, porque qualquer documento é, ao mesmo tempo, verdadeiro -- incluindo talvez sobretudo os falsos -- e falso, porque um monumento é em primeiro lugar uma roupagem, uma aparência enganadora da montagem. É preciso começar por desmontar, demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de produção dos documentos-monumento." (p. 538)

LE GOFF, Jacques. Documento/Monumeno. In: ______. História e Memória. 5. ed. Campinas: UNICAMP, 2003. p. 525-541.